Você ganha um belo vaso, exemplar raro
da dinastia Aquela-Mesma. Você o quis, talvez; ou ainda pode tê-lo ganho por
acaso. Mas desenvolve um apreço gigante por aquela linda peça decorativa. E
você ganha elogios por tão belo item que adorna tua morada. E você desenvolve
ainda mais apreço, pois as palavras inflam o teu ego, fazem com que você se
sinta sempre bem em função daquele item que embeleza tua existência.
Mas aí as coisas começam a ficar
engessadas. A casa prestes a ruir, nada mais no entorno importa, somente o
belíssimo vaso. Parado, cada vez mais gelado (e congelante), mas belo. Porque
te dizem que é belo. Porque você um dia achou belo (ainda que, entre quatro
paredes, com a cabeça deitada no travesseiro, você já não veja mais tanta beleza).
Mas a beleza da reputação dele é a sua beleza, ao menos é o que dizem.
E a casa caindo... E o mundo
acinzentando... Mas o vaso está lá. Até que sobra você e o vaso. Belo vaso.
Lindíssimo vaso, não é o que sempre te disseram? Beleza ofuscante. Ofuscou tua
vista. Te botou uma tapa de cavalo, não mais olhou para os lados, porque é um
belo vaso. Um Sol no teu céu. Mas o Sol cega se muito o mirares.
Antes da cegueira, as lágrimas,
abundantes. A dor, lancinante. E você, num átimo, num acesso de Rainha de Copas
louca por decapitações, decide: é hora de quebrar a porra do vaso! Foda-se sua
beleza! Foda-se a beleza que todos dizem que ele tem! Agora ele te é horroroso!
E você quer apreciar belezas de novo... Que venham novas belezas.
Cacos de um vaso... Restos de uma beleza...
Morta beleza, feita em pedaços. Mas uma percepção segue íntegra: a de que
beleza não tem um só conceito. Não tem só um jeito. Beleza é o imperfeito. O
estranho, torto, esquisito cotidiano. Beleza é você, é eu, é tudo. É tanta
coisa. Tantos vasos. Talvez um vaso de barro, simples. Mas se ele te é belo,
isso que importa.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Vai, me fala. ;-)